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A advocacia é a profissão das esperanças

 

POR RAUL HAIDAR

Fonte: Conjur

Em 11 de agosto comemoramos o Dia do Advogado, data em que foram criados os cursos jurídicos no Brasil e como os operadores do direito conhecem sua história, podemos fazer algumas reflexões que nos parecem relevantes não em função do passado, mas do futuro, que é o que nos interessa.

Advogados são felizes
Ainda que muitas pessoas pensem de forma diferente, nós advogados somos criaturas humanas e fomos criados para sermos felizes. A advocacia é instrumento da felicidade, pois viabiliza a liberdade daquele que a tenha perdido injustamente ou que se veja ameaçado de perdê-la.

Também é graças à advocacia que se protege a honra das pessoas ou se obtém reparação quando ela é atingida. O patrimônio do nosso cliente também é recuperado ou protegido graças ao trabalho do advogado.

Ora, se o trabalho do advogado viabiliza a felicidade de seus clientes, nenhum advogado pode esquecer-se de que a nossa profissão, como qualquer outra, é um instrumento da felicidade de quem a exerça.

Se uma pessoa não está feliz em sua profissão, deve procurar outra. São inúmeros os casos de pessoas que se formaram em determinado curso, passaram a exercer esta ou aquela profissão e depois foram para outra. Há o psicólogo que se tornou cozinheiro, a contadora que se tornou psicóloga, o advogado que se tornou jornalista, a médica que se tornou atriz, enfim, as pessoas querem a felicidade. Como disse Ferreira Gullar: “Não quero ter razão, quero é ser feliz”.

Os preconceitos
Há muitos preconceitos ridículos no cotidiano do advogado que devemos eliminar. Estamos no século 21, onde a única coisa permanente é a mudança, a transformação e onde preconceitos revelam apenas ignorância e atraso. Certas posturas e afirmações preconceituosas prejudicam a advocacia, causam um mal enorme à sociedade e inviabilizam um exercício profissional capaz de levar alguém a ser feliz.

O preconceito “escolar” é um deles. Encontramos anúncios onde se exige que o candidato a uma vaga de advogado tenha se formado em faculdade “de primeira linha”, na vã esperança de que o idiota possa ter se curado da idiotice porque o diploma que carrega é desta ou daquela escola. Pelo que sabemos, “linha” é coisa de costureiros ou de ferrovias, não de cultura jurídica ou de advocacia.

Na área do Direito o conhecimento hoje é amplamente disponibilizado. Já não se aprende apenas nas salas de aulas onde mestres iluminados transmitem sua sabedoria aos alunos como se estes fossem se iniciar em alguma instituição esotérica e aos poucos escalar uma nova escada de Jacó.

Imaginar que só existe qualidade de ensino em meia dúzia de escolas é pretender que apenas alguns grãomestres dos augustos mistérios do direito possam ter o monopólio da sabedoria jurídica e os segredos do conhecimento, por integrarem alguma academia de sábios transplantados diretamente do Olimpo.

Outro preconceito idiota (perdoem-me o pleonasmo) é o jovem advogado ou pior ainda o cliente desinformado imaginar que a boa advocacia é a exercida nos “grandes escritórios” ou “firmas”. Não há aí qualquer indício de que esteja presente uma reserva de qualidade nos serviços. Um advogado já falecido me dizia que um grande escritório poderia ser comparado a uma boiada onde havia muitas cabeças, mas todas de quadrúpedes.

Brincadeiras ou maldades à parte, há espaço para escritórios pequenos na advocacia e haverá sempre. Dizer que o pequeno escritório vai desaparecer ou vai ser “engolido” pelos maiores é imaginar que a advocacia possa ser comparada ao mercadinho ou à lojinha da esquina.

Aliás, está havendo no mundo todo um movimento bem diferente desse. Aqui mesmo em São Paulo isso acontece. Vemos quase todo dia anúncios ou notícias que dizem que em determinada “firma” foram admitidos mais dois ou três advogados ou que outro tanto se tornaram “sócios”. Isso é muito bom, pois revela que alguns colegas estão trabalhando e progredindo. Mas nunca vimos notícias ou anúncios de que advogados saíram daquelas “bancas” para abrir escritórios pequenos ou mesmo para tomar outros rumos.

Muitas empresas ou pessoas já deixam os grandes escritórios e procuram os pequenos, onde podem contar com serviço personalizado e eficiente.

Se o advogado recentemente formado tiver esse preconceito e alimentar o sonho de trabalhar num grande escritório, pode ter sucesso. Mas vai ter que passar um bom tempo pastando, trabalhando mais de 10 horas por dia, inclusive sábados, domingos e feriados, em troca de salário que não é suficiente para pagar o passeio que o dono do escritório fez no último fim de semana.

Portanto, ninguém pode ter êxito na advocacia se exercê-la a partir de preconceitos, de visões ultrapassadas do mundo, de uma posição genuflexa ante os falsos proprietários da verdade ou aos ridículos monstros do direito.

A realidade
Nunca é demais lembrar que o Dia do Advogado não é apenas uma data no calendário. Também não podemos esquecer que se algumas pessoas deixam de trabalhar nesse dia a pretexto de nos homenagear, o que querem mesmo é apenas faltar ao serviço, pois estão se lixando para os advogados e sempre que podem nos ignoram ou nos maltratam.

Devemos considerar que o Dia do Advogado é todo dia. Não basta que sejamos homenageados em 11 de agosto e desprezados nos outros dias do ano. Mas o pior desprezo que podemos sofrer é o praticado por nós mesmos.

Dizem muito que a vida do advogado está difícil e que a advocacia está sendo destruída e mesmo que a OAB acabou. Essas afirmações não são verdadeiras e representam uma doença mental, que impede o doente de raciocinar com clareza e o faz delirar, ter alucinações e dizer coisas desconexas.

No mundo atual todas as profissões liberais passam por grandes transformações, com o que as pessoas que as exercem estejam tendo uma vida difícil. Dizem até que uma antiga profissão, a das chamadas “mulheres da vida fácil”, vem enfrentando dificuldades.

Sempre haverá advocacia
A advocacia não está sendo e jamais será destruída, pois ela cuida da litigiosidade social, dos conflitos entre as pessoas, enfim, dos problemas mais relevantes do homem, como o patrimônio, a honra e a liberdade. Não há qualquer indício de que esteja acabando. Muito pelo contrário: cresce a cada dia, com um grande numero de pessoas desejando ser advogados. Se isso é bom ou mau, o tempo dirá. Mas o exercício desta ou daquela profissão pelas pessoas legalmente habilitadas, não pode ter limites. Se para muitos a advocacia é um trabalho, um meio de vida, não podemos nos esquecer que para tantos outros isso é, antes de mais nada, um sonho, uma esperança, um desejo inamovível que se traz na alma. Não podemos limitar o sonho de ninguém.

Não é por acaso nem por corporativismo que a Constituição diz que o advogado é indispensável à administração da Justiça. Ainda que no Brasil muitos ignorem a Carta Magna e mesmo que autoridades a desrespeitem, os princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos apontam na direção de que a Justiça é o principal postulado da civilização. Os artigos 10 a 13 desse estatuto garantem os direitos básicos de qualquer pessoa em qualquer país e sua observância passa necessariamente pela ação da advocacia.

Quando o homem saiu das cavernas e resolveu criar a sociedade que se pretende civilizada, a primeira razão foi a justiça, para evitar que a humanidade pudesse se comportar como selvagem. O país pode privatizar a segurança, a educação, a saúde, enfim, praticamente todo o atendimento às necessidades dos seus cidadãos. Mas se admitir a privatização dos serviços da Justiça estará renunciando à sua própria razão de ser como sociedade politicamente organizada, institucionalizando-se a anarquia.

Nessas condições, é impossível admitir a existência de um estado de direito, de uma sociedade civilizada, se afastarmos a presença da advocacia. Consequência lógica disso: não há civilização sem advogados. Portanto, a advocacia pode se transformar ao longo do tempo, mas jamais deixará de existir.

Profissão séria
Devemos sempre ter em conta que advocacia é profissão. Já ouvi várias vezes colegas e até conselheiros da OAB-SP, em plena sessão do Conselho, afirmarem que a advocacia é um “sacerdócio”.

Ora, se eu quisesse ser sacerdote teria estudado teologia. Isso não teria sido difícil, pois meus primeiros três anos de faculdade foram na PUC-SP. Outrossim, dizem que há sacerdotes bem sucedidos, ganhando bastante dinheiro, muito mais do que se fossem advogados.

Advocacia é profissão e meio de vida. Dela tiramos o nosso sustento e o de nossos dependentes. Se o advogado está habilitado a fazer concursos e exercer funções que ofereçam determinada remuneração, deve ganhar o suficiente para compensar a escolha profissional, a opção pela advocacia.

A realidade prova que mais de 98% dos advogados são sérios e portam-se conforme a lei, como se constata no exame do numero de inscritos e a proporção dos punidos pelo Tribunal de Ética. Diante de 600 mil advogados, menos de 12 mil agem mal.

Após 36 anos de advocacia, digo aos novos colegas: a advocacia não é a profissão das certezas, mas das esperanças. A maior parte das minhas esperanças foram plenamente alcançadas na advocacia. Se todas não foram, o culpado fui eu, que exagerei nos sonhos ou negligenciei no esforço.

O Dia do Advogado deve ser comemorado não apenas em 11 de agosto, mas todos os dias em que realizamos nosso trabalho com respeito, seriedade e ética. Por tudo isso e mais algumas coisas é que a advocacia faz a felicidade de nossos clientes e a nossa também.

Monitoramento eletrônico: avanço ou retrocesso?

 

POR EDUARDO VIANA PORTELA NEVES

Enfim, parece que o Brasil passou a enfrentar algumas questões que sempre foram tratadas como dogmas pela doutrina nacional. Para minha surpresa, foi aprovado o projeto de lei que implementa o monitoramento eletrônico (PL 175/2007). Isto significa, portanto, que, embora criado como alternativa à prisão desde 1983 (EUA), só agora o monitoramento eletrônico será seriamente debatido.

Foi aprovada no último dia 20, no Senado, e encaminhada para sanção presidencial a Lei do monitoramento Eletrônico. Em uma postura ainda muito tímida, no que se refere à implementação das novas tecnologias na execução penal, o novel diploma altera o artigo 36 do CP, bem assim os artigos 66, 115, 122 e 132 da Lei de execução penal.

Após a aprovação do Senado, o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, manifestava sua insatisfação sobre o projeto:

Essa medida é algo que, num primeiro momento, nos assusta; não se pode conceber que alguém que cumpre pena possa sair da penitenciária, apenas com o dinheiro do ônibus no bolso  e uma pulseira no tornozelo – certamente, essa pessoa vai voltar ao crime, se o sistema não lhe dá qualquer acompanhamento assistencial e social.

O Estado brasileiro não pode transferir para as famílias, para a sociedade, uma obrigação que é sua, que é paga pelos nossos impostos, como contribuintes que somos

A par das discussões mais amplas que envolvem o tema, é preciso trazer à baila alguns dados que servirão de base à conclusão final deste artigo. Segundo informações consolidadas do Departamento Penitenciário Nacional, há hoje, aproximadamente, 473.626 detentos no sistema prisional brasileiro, com déficit carcerário de quase 140 mil vagas. Aliado a estes dados é preciso informar que um preso custa aos cofres públicos, por mês, em média, R$ 1,6 mil reais. Ao passo que um preso submetido ao monitoramento eletrônico, apenas para tratar do aspecto econômico, custa, em média R$ 400. Pois bem.

Sinteticamente pode-se dizer que o monitoramento eletrônico é uma alternativa tecnológica à prisão utilizada na fase de execução da pena, bem assim na fase processual e, inclusive, em alguns países, na fase pré-processual. Há, ainda, legislação admitindo, em casos de delitos especialmente graves (equivalente aos nossos crimes contra a dignidade sexual), o monitoramento eletrônico após a execução da pena privativa de liberdade. É o que determina o recém alterado código de processo penal francês (Título VII ter, art. 763-10 e seguintes[1]).

Porém, ao contrário do que se pode imaginar, a proposta de monitoramento eletrônico como alternativa à prisão não é nova, aliás, é bem antiga. Indica-se que desde 1946, no Canadá, já havia experiências de controle de presos em seu domicílio[2]. No entanto, a sua prática judicial é algo mais recente. Conforme enuncia CÉRE, a idéia partiu de uma história em quadrinhos, quando, em agosto de 1979, um magistrado americano, Jack Love, leu em um jornal local um trecho do “Homem Aranha” onde era mencionada a possibilidade de usar uma pulseira como transmissor; neste episódio, o bandido conseguiu localizar o herói graças a um dispositivo colocado em seu punho[3].

Esta ideia despertou o interesse do magistrado que, imediatamente, contratou um engenheiro eletrônico para desenvolver o sistema de monitoramento. A partir daí a medida se espalhou rapidamente por todos os estados norte-americanos[4]; quatro anos depois, mais da metade dos estados já adotavam o monitoramento.

Basicamente, três são os fundamentos para a intervenção tecnológica, dois deles já enunciados no texto: superpopulação carcerária, custos do encarceramento e, principalmente, redução da reincidência. Por outro lado, a despeito destas vantagens, também postas em dúvida, várias são as críticas dirigidas ao sistema de monitoramento eletrônico, quais sejam: violação da intimidade, excesso de punição e, principalmente, violação da dignidade da pessoa humana[5].

Talvez a única crítica que abra flanco para uma discussão metafísica, como sempre, seria a possível violação ao princípio da dignidade da pessoa humana. Isto porque, segundo parece bastante crível, os outros pontos favoráveis à implementação do monitoramento – redução da população carcerária e reincidência –, são objetivamente verificáveis e, portanto, empiricamente demonstráveis. Pois bem.

O grave entrave quanto à aplicabilidade do princípio da dignidade humana é determinar sua extensão. Salvo melhor juízo, o discurso contra-reformista, com seu absolutismo exagerado, contribuiu muito para a porosidade do princípio. A tentativa de absolutizá-lo teve como consequência o esvaziamento de seu conteúdo, hoje não se sabe ao certo o que fere ou não a dignidade humana. Por isto, para delimitar ao objeto deste artigo, pode-se construir um conceito negativo de dignidade humana, qual seja: catálogo de medidas que obsta o pleno desenvolvimento da autonomia humana.

Estabelecida a base conceitual, olhemos para a Constituição da República objetivando identificar e recolher quais direitos dos presos são fundamentais. Para ficar em três dispositivos, enumeremos os seguintes:
XLVIII – a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado;
L – às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação;
XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;

Pois bem, será que o Estado vem cumprindo com as determinações do núcleo intangível da Constituição? Não precisa ser nenhum criminólogo para constatar a distância entre a realidade e a teia normativa (isso para ficar na norma constitucional). Nas raras vezes em que há, através de ação civil pública, judicialização deste fato, pergunto-lhes: qual o princípio chamado à ordem para fundamentar o provimento do pedido? Para responder à indagação, colhamos trecho da seguinte decisão do TJ Mato Grosso do Sul:
O Estado não vem dando soluções razoáveis ao problema, que vem se agravando dia a dia, resultando em constantes motins, muitas vezes de difícil e cara solução, com perdas não só de patrimônio, mas e principalmente de vidas de reclusos e de servidores públicos. Não há dúvida de que as revoltas acontecem exatamente em função do tratamento desumano e indigno dispensado pelos estabelecimentos penais aos reclusos. A falta de espaço nas celas e de sanitários adequados viola o direito à vida privada, à intimidade e à própria honra da pessoa, que são conseqüências do princípio da dignidade humana, portanto violação de um dos princípios fundamentais da República Federativa do Brasil[6].

Abrindo um pequeno parêntese, para não ficar apenas no âmbito interno, não se pode olvidar a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH). Conhecida como Pacto de São José da Costa Rica (1969), foi incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro em 1992, muito embora o Brasil só tenha se submetido à jurisdição da Corte a partir de 10 de dezembro de 1998.

A CADH é o documento através do qual os Estados se obrigam a lutar contra as violações aos Direitos Humanos havidas no âmbito de suas respectivas bases territoriais, adotando ações necessárias à investigação e punição de atentados desta natureza. Ao aderirem ao Pacto os Estados assumem deveres de proteção e adoção de medidas no plano interno para tornarem efetivas os direitos e garantias estabelecidas na convenção. Não é nenhuma surpresa destacar que o Brasil já foi internacionalmente reconhecido como violador de Direitos Humanos, conforme paradigmático caso Damião Ximenes.

Disto se infere, estabelecendo uma premissa preliminar, que o nosso Poder Judiciário e a Corte Interamericana reconhecem e condenam o Estado brasileiro como violador sistemático do princípio da dignidade humana.

Por outro lado, para se estabelecer um sistema de comunicação com o princípio da dignidade humana, imperioso investigar, agora, sobre a finalidade da execução penal.

Não há espaço para dúvida quando se afirma haver uma incindível relação entre intensidade da intervenção da execução penal e interesse socializador [7]. Estes dois conceitos, ligados entre si, convivem em aparente antinomia e, por isto mesmo, conduzem a algumas discrepâncias em relação aos regimes de cumprimento de pena, ora para justificar desnecessidade de intervenção (penas de curta duração), ora para justificar seu incremento (a exemplo do RDD).

Alguns fatos ligam-se diretamente a esta antinomia, em especial, sobrecarregamento do sistema prisional e imposição do sistema de execução penal. Por hora, interessa-nos este último.

Como afirma a lei de execução penal alemã, a prevenção especial tem por finalidade possibilitar que o preso leve uma vida sem delitos[8]. Em sentido próximo, enuncia nossa legislação que a execução penal tem por finalidade “… Proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”. Dos dois comandos normativos se infere que objetivo primordial da execução penal é humanização da execução penal, vale dizer, colocá-la em unissonância com representações aperfeiçoadas de uma execução penal humanitária[9].

Acontece que nosso modelo de execução penal não permite a participação do condenado na escolha dos caminhos e diretrizes da execução, ou seja, há uma imposição sistêmica das regras de execução da pena privativa de liberdade.

Mas, se contrapondo a este modelo exclusivamente institucionalizado de execução de pena, fala-se em uma concepção de execução penal denominada de terapia social emancipadora. Pode-se reconhecer nesta concepção o seguinte: este conceito estimula ao máximo a idéia da execução do tratamento e ao mesmo tempo um aperfeiçoamento da concepção de terapia individual preventiva[10]. Isto demonstra que: “sem a garantia da autonomia do indivíduo submetido ao tratamento, isto é, de sua decisão livre para a aceitação, para a continuação e para as formas de terapia, só é possível um tipo deficiente de tratamento[...][11]”. Assim, só se pode falar em humanizar a execução da pena com a participação, quando possível, dos sujeitos submetidos ao tratamento.

Neste momento, é preciso agregar uma característica do monitoramento eletrônico: ele só pode ser realizado com expressa autorização do condenado. Disto depreende-se que o monitoramento se amolda a um modelo de execução penal que melhor se alinha aos ditames constitucionais e ao próprio conceito de dignidade humana, eis que evita a inocuização do indivíduo, integrando-o à uma modalidade de tratamento que evita sua inserção em um sistema prisional produtor de delinquência secundária e  reconhecidamente falido.

Deste modo, objetar o monitoramento como alternativa à inclusão do condenado em um sistema prisional falido é, verdadeiramente, negar o princípio da dignidade humana. Não se pode perder de vista, repise-se, embora silente o projeto de lei, que o monitoramento só se aplica aos condenados que a ele desejam se submeter.

De mais a mais, controle eletrônico ou controle prisional são duas graves modalidades de intervenção do Estado sobre o indivíduo, mas não se pode perder de vista que a pena, como afirmou o projeto alternativo de código penal alemão (1966), é uma amarga necessidade em uma sociedade de seres imperfeitos.

Por isto, penso que qualquer proposta que escape às discussões e transições metafísicas, ou seja, qualquer proposta que deixe de lado a retórica deslegitimadora do sistema prisional e proponha algo factível deve, ao menos, ser objetivamente considerada e concretizada. Se a medida será positiva ou negativa, um avanço ou retrocesso, só o tempo dirá! Afinal, enquanto não se chega à universalização de RADBRUCH – a melhor reforma do direito penal seria a de substituí-lo, não por um direito penal melhor, mas por qualquer coisa melhor que o direito penal e, simultaneamente mais inteligente e mais humano que ele[12]–, o monitoramento apresenta-se como uma particular afirmativa, ou seja, melhor seria se inexistisse o controle, mas, diante da amarga necessidade, é ele (o monitoramento) algo muito melhor que o encarceramento.

Especificamente sobre o projeto de lei, em minha avaliação, acredito que a aplicabilidade dos dispositivos será inexistente, fato que, aliás, não é nenhuma novidade no Brasil, notadamente tratando-se de regras de execução penal (lembrem-se, apenas para ficar em um único exemplo, do quanto disposto no art. 88, parágrafo único, “b” da Lei de Execução Penal)

De tudo quanto exposto, portanto, pode-se concluir que o fundamento que sustenta a argumentação contrária ao monitoramento é tautológico e, por isto, não pode ser cientificamente invocado. Razão pela qual optar pelo uso da “pulseira”, “bracelete” ou “tornozeleira” eletrônica – o nome é o que menos importa – é uma decisão pessoal de cada condenado que fomenta o desenvolvimento da autonomia humana. Não há por que proibir de usá-la a alguém que prefira.

Enfim, não se respeita a dignidade humana retirando-lhe, com base em mera especulação metafísica, a sua possibilidade de escolha sobre o modelo de controle que deve pesar sobre si.

Notas convertidas:
[1] Titre VII ter: Du placement sous surveillance électronique mobile à titre de mesure de sûreté.
[2] CÉRE, Jean-Paul. La surveillance électronique : une réelle innovation dans le procès pénal?. Revista da Faculdade de Direito de Campos, Campos dos Goytacazes, RJ, v. 7, n. 8, p. 105-122, jan./jun. 2006, p. 107.
[3] Ibid.

[4] “Cette idée ayant immédiatement intéressé le juge Jack Love, il prend contact avec un ingénieur électronicien, et lui demande de développer un systeme de monitoríng. En 1983 ce juge teste lui-même pendant plusieurs semaines un bracelet. II ordonne ensuite le placement sous surveillance électronique de cinq délinquants dont un violeur. Tres rapidement, le placement sous surveillance électronique se développe aux Etats-Unis, sous la forme de projets pilotes (à Washington, en Virginie, en Floride notamment). Moins de 4 ans plus tard, 26 Etats américains utilisaient le placement sous surveillance électronique”. Ibid.

[5] Para uma análise das críticas cfr. JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano; MACEDO, Celina Maria. O brasil e o monitoramento eletrônico. In:Monitoramento eletrônico uma alternativa à prisão? Experiências internacionais e perspectivas no Brasil, Brasília: CNPCP, 2008, p. 26 e ss.
[6] Ref. proc. 2006.015034-1 – TJ/MS.
[7] Não entendo adequado o termo ressocializar, pois ele pressupõe uma socialização anterior. Olhando para as classes que frequentam as engrenagens do sistema, evidente que aquela não ocorreu.
[8] Strafvollzugsgesetz – StVollzG “§ 2.º Im Vollzug der Freiheitsstrafe soll der Gefangene fähig werden, künftig in sozialer Verantwortung ein Leben ohne Straftaten zu führen (Vollzugsziel).”
[9] HASSEMER, Winfried. Introdução aos fundamentos do direito penal; trad. Pablo Rodrigo Alfen. Porto Alegre: SAFE, 2005, p. 385.
[10] Ibidem, p. 385-386.
[11] Ibid., (negritei).

[12] RADBRUCH, Gustav. Filosofia do direito; trad. L Cabral de Moncada. 6. ed. Coimbra: Arménio Amado, 1979, 324.

Fonte: Conjur

CDC deve estar à disposição ao público

 

 

POR LUÍS RODOLFO CRUZ E CREUZ E MARIA FERNANDA RAMIREZ ASSAD

A proteção do consumidor é preceito fixado em nossa Constituição Federal e nos mais diversos normativos, brasileiros e estrangeiros. Neste sentido, além da edição do próprio Código de Defesa do Consumidor, diversas normas e regulamentos estão sempre sendo editados e atualizados visando dar cumprimento ao público consumidor.

E, neste sentido, no último dia 20 de julho de 2010, foi sancionada pelo presidente Lula, a Lei 12.291[1], que fixa a obrigação dos estabelecimentos comerciais e/ou de prestação de serviços, de disponibilizarem ao público de modo geral, um exemplar da Lei 8.078/1990, o Código de Defesa do Consumidor (“CDC”)[2].

Com essa nova norma, todos os estabelecimentos do ramo do comércio ou que sirvam à prestação de serviços, estão obrigados a deixar à disposição do público, em local visível e de fácil acesso ao público, 1 exemplar do CDC[3].

Ademais, a norma nos traz alguns pontos cuja análise é, no mínimo, curiosa.

Naturalmente, primeira omissão que pode ser identificada ao analisar a lei refere-se a forma de disponibilização. Ainda que possa ser afirmado que tal disponibilização seja de um exemplar impresso, a lei nada indica, o que deixa a opção, para proprietários dos estabelecimentos do ramo do comércio ou que sirvam à prestação de serviços tenha à disposição do público uma versão eletrônica, que por dever estar visível, pode estar em algum micro-computador,notebook ou até em um netbook.

Quanto à análise dos reflexos produzidos por essa nova legislação, devemos considerar quais as consequências da disponibilização do CDC nos estabelecimentos comerciais. Assim, nos deparamos com a seguinte situação: consumidores de modo geral, com a possibilidade de, antes de efetuarem quaisquer compras de produtos ou serviços, verificarem seus direitos e obrigações no CDC. Tal situação pode representar hipoteticamente uma vantagem ou garantia aos direitos dos consumidores. Mas é importante lembrarmos que a leitura de qualquer Lei exige determinado conhecimento, inclusive interpretativo.

Desta forma, num segundo momento, somos levados ao seguinte questionamento: será que a acessibilidade ao CDC, para o público de modo geral, no próprio estabelecimento, não pode nos levar à eventuais situações de dúvidas ou embates, até mesmo desnecessários? Um leigo, de posse da norma, ao tentar interpretá-la, não poderá encontrar mais dúvidas que respostas? Será obrigação do comerciante ou prestador de serviços esclarecer as duvidas do consumidor?

A Lei determina que um exemplar do CDC seja disponibilizado, mas a quem pertence a obrigação de leitura e compreensão da norma, inclusive em sua aplicabilidade prática? Entendemos que tal ato é de atribuição dos profissionais, operadores e aplicadores do direito, e não do estabelecimento comercial ou de prestação de serviços, pois estes devem dispor de profissional para auxiliar o público no que se refere às suas atividades-fim.

Ora, ninguém pode alegar desconhecimento de Lei, nos termos do artigo 3º da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro[4]. O CDC deve ser lido e consultado por todo e qualquer cidadão, assim como deve ocorrer com a Constituição Federal, com o Código Civil, e com tantas outras normas.

O que questionamos aqui, é se a forma de acessibilidade imposta por essa nova lei é realmente eficaz e produz os resultados pretendidos em relação ao consumidor, de conscientização e de capacidade de exigir seus direitos. A promulgação de uma norma, sem uma prévia e profunda analise acerca de seus reflexos, pode acabar por não produzir os efeitos pretendidos, possibilitando ainda, trazer alguns transtornos.

De nada adianta ter acesso às informações no momento da compra se o consumidor não souber interpretá-las e utilizá-las. O simples fato de ser facilitado o acesso do consumidor ao CDC, não implica na sua conscientização ou capacidade de exigir os direitos que lhe são legalmente garantidos. A formação do cidadão consciente, inclusive em relação às normas do país em que vive, deve acontecer bem antes de sua entrada no estabelecimento comercial ou local de prestação de serviços.

Por fim, importante indicar que no caso de não cumprimento da obrigação fixada pela nova Lei, os infratores deverão arcar com o pagamento de multa no montante de até R$ 1 mil[5]. Um ponto obscuro dessa norma é em relação à incidência dessa multa, se sua aplicação é diária, até o momento de corrigida a infração, ou se é calculada conforme o número de vezes em que for apurado o não cumprimento desta.

Ressaltamos que a proposta original de penalidades era muito mais rígida, mas foi objeto de veto presidencial. Em caso de não observância da obrigação legal, além da multa prevista, existiam ainda 2 incisos que determinavam a suspensão temporária da atividade e a cassação da licença do estabelecimento. Em razão dos vetos[6], restou apontado que o CDC restringe a aplicação das penas de suspensão temporária da atividade e de cassação de licença somente para as infrações de maior gravidade e, ainda, apenas quando houver reincidência, restando evidentemente desproporcional a aplicação destas penalidades em caso de descumprimento do disposto lei em comento.

Fonte: Conjur

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