Muitos
brasileiros, devido à crise econômica, tiveram perda significativa na renda e
no poder aquisitivo do salário, fazendo com que grande parte não tivesse
condições financeiras de continuar pagando aquele financiamento imobiliário
contraído há algum tempo atrás, quando o país atravessava boa fase e tínhamos
muitas ofertas para aquisição do tão sonhado imóvel próprio.
Como
conseqüência disso, agora está ocorrendo o inevitável: O consumidor não
consegue mais honrar com o compromisso de pagar as parcelas do contrato
celebrado com a construtora ou banco, tendo que optar pela rescisão contratual,
o que acaba resultando em abusos por parte de algumas empresas, que se utilizam
de meios ilegais para impedir o consumidor de cancelar o contrato.
Neste
sentido, é importante o consumidor buscar informações sobre seus direitos para
que não seja lesado e acabe pagando indevidamente ou deixando de receber
valores devidos.
Primeiramente,
um ponto que merece atenção quanto à rescisão contratual é o caráter
“irretratável” que muitas empresas fazem constar do contrato. Trata-se de uma
ilegalidade, pois retira a liberdade do consumidor de cancelar o contrato, o
que está disposto como direito básico do consumidor, sendo vedada cláusulas ou
práticas abusivas, e assegurada a liberdade de escolha, como prevê o artigo 6º,
do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90). Essa cláusula de
irretratabilidade pode confundir o consumidor, fazendo com que o mesmo não
busque ou tenha o cancelamento negado, figurando como vantagem desproporcional,
fatalmente levando o consumidor à inadimplência.
Outra
prática abusiva comumente observada é a retenção excessiva dos valores já
pagos, quando da rescisão contratual, chegando em casos extremos ao absurdo de
100% (cem por cento) de retenção dos valores já adimplidos.
Estamos diante de outra ilegalidade, como
prevê o código de defesa do consumidor (lei 8.078/90), em seu artigo 53,“ Nos
contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em
prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se
nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das
prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento,
pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado.’’
A
lei veda expressamente a retenção total do dinheiro já pago, o que não intimida
muitas empresas, que insistem em se enriquecer ilegalmente.
Ademais,
outros dispositivos legais proíbem obrigações que coloquem o consumidor em
desvantagem exagerada, ou que subtraia a opção de reembolso pela quantia já
paga pelo consumidor, ou até mesmo que tire a opção de rescindir o contrato,
como dito acima.
O
entendimento dos tribunais superiores nestes casos, é pelo pagamento de multa
por rescisão, de 10 a 25%, variando a depender
do prejuízo que possa eventualmente ter causado (taxas de condomínio, aluguel
em atraso, contribuições, impostos não pagos, etc).
Neste
sentido, recentes julgados do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e
Territórios:
Data de publicação:
10/03/2015
Ementa: DIREITO
CIVIL. CONTRATO DE
PROMESSA DE COMPRA E VENDA.RESCISÃO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS. DIREITO BÁSICO DOCONSUMIDOR.
DIREITO DE RETENÇÃO. 10% DO VALOR PAGO. I – Rescindido o contrato de promessa de compra e
venda, as partes devem retornar ao status quo ante, de modo que assiste ao
comprador o direito a restituição de toda a quantia repassada ao vendedor,
devendo ser abatida a título de cláusula penal compensatória somente a
percentagem de 10% sobre o valor total pago. II – Negou-se provimento ao
recurso.”
Data de publicação:
21/07/2015
Ementa: DIREITO CIVIL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA.RESCISÃO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS. DIREITO BÁSICO DOCONSUMIDOR. DIREITO DE RETENÇÃO. 10%
DO VALOR PAGO. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. I – Rescindido o contrato de promessa
de compra e venda, as partes devem retornar ao estado anterior, de modo que
assiste ao comprador o direito a restituição de toda a quantia repassada ao
vendedor, devendo ser abatida a título de cláusula penal compensatória somente
a percentagem de 10% sobre o valor totalpago. II - Os honorários advocatícios devem ser fixados entre o
mínimo de 10% e o máximo de 20% sobre o valor da condenação, atendidas as normas das
alíneas a, b, e c do § 3º do art. 20 do CPC . III – Negou-se provimento aos
recursos.
Isso
demonstra que o entendimento jurisprudencial se firma em determinar o retorno
das partes ao estado em que se encontravam antes da contratação, devendo os
valores eventualmente pagos serem devolvidos, abatidos, em regra, 10% sobre o
valor total pago, à título de cláusula penal compensatória.
Isto,
é claro, tratando-se de rescisão imotivada
por parte do consumidor, diferente de rescisão por culpa da construtora, que
não entrega o imóvel no prazo, por exemplo. Neste último caso, o consumidor,
além de ter direito à devolução integral dos valores pagos, atualizados e
corrigidos, também poderá pleitear danos morais, o que deverá ser analisado
caso a caso.
Além
disso, a devolução dos valores deve ser à vista e com valores atualizados monetariamente,
não se admitindo parcelamentos e prazos para pagamento, de acordo com a súmula
543, do STJ, que assim prevê:
“Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e
venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a
imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador -
integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou
parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.”
Outra
questão muito presente nos contratos de financiamento imobiliário é a taxa de
corretagem que é cobrada, mesmo sem o consumidor ter contratado corretor, o que
também é proibido, pois configura venda casada, expressamente vedada pelo
Código de Defesa do Consumidor.
Uma
vez que o corretor atua efetivamente na celebração do contrato, sua remuneração
é devida, porém, quem deve arcar com o pagamento deve ser quem o contratou, e,
na maioria dos casos, o consumidor se dirige diretamente ao stand de vendas da construtora,
portanto, não deve ser obrigado a pagar pela taxa.
Neste caso, quem deve se responsabilizar pelo
pagamento da taxa de corretagem é a construtora, pois ela quem se beneficia do
trabalho do corretor, de modo que, embutir o valor da taxa de corretagem no
preço do imóvel sem a ciência do comprador configura prática abusiva.
Assim,
caso o consumidor pague indevidamente valores à título de taxa de corretagem,
deve ter esse valor devolvido atualizado e corrigido, e, em caso de má-fé
comprovada, a devolução deverá ser em dobro, conforme prevê o artigo 42,
parágrafo único, do código de defesa do consumidor.
Ademais,
todos os valores devolvidos ao consumidor quando da rescisão contratual devem
ser atualizados monetariamente e pagos imediatamente.
Portanto,
o consumidor que se ver em alguma(s) das situações acima descritas, deve tentar
um acordo amigável com a empresa, e, caso subsista a situação, não haverá outra
solução que não o ajuizamento de ação judicial reivindicando os valores retidos
e/ou cobrados indevidamente.
AUTORIA: Dr. Paulo Sérgio Martins Filho.