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ESCRITÓRIO TEM ÊXITO EM AÇÃO QUE LIMITA EM 30% DESCONTO EM CONTA CORRENTE DE SERVIDOR PÚBLICO.

 

Sentença
Trata-se de ação de conhecimento sob o rito ordinário ajuizada por HUGO CABRAL DE OLIVEIRA em desfavor do BANCO DE BRASÍLIA S/A.
O autor argumenta, em apertada síntese, ter celebrado 2 Cédulas de Crédito Bancário e 1 empréstimo bancário com a instituição requerida.
Tece arrazoado no sentido de postular a revisão contratual, a fim de limitar o desconto ao percentual máximo de 30% (trinta por cento), em relação aos contratos celebrados com o réu. Pede, ainda, a devolução em dobro de todos os valores pagos a maior.
Ao final, requer a revisão das cláusulas contratuais supramencionadas.
Junta os documentos de fls. 21/41.
Emenda a inicial às fls. 46/48.
Às fls. 50/51 foi deferido o pedido de antecipação dos efeitos da tutela.
O requerido foi citado e ofertou contestação às fls. 58/67.
Argumenta que os atos jurídicos são perfeitos e que há autorização para os descontos bancários, sendo estes fruto da manifestação de vontade das partes contratantes.
Tece arrazoado no sentido de postular o reconhecimento de legalidade das demais cláusulas contratuais.
Ao final requer a improcedência do pedido.
Não houve dilação probatória. Os autos vieram conclusos.
É o breve relatório. DECIDO.
Por não haver a necessidade de produção de outras provas e por o feito já se encontrar maduro, passo ao julgamento do feito.
Não existem questões preliminares a serem apreciadas, assim como não verifico a existência de nenhum vício que macule o andamento do feito. Desta forma, compreendo estarem presentes os pressupostos processuais de existência e validade da relação processual e as condições da ação.
Adentro a análise da questão meritória.
A questão cinge-se a análise da possibilidade de revisão de determinadas cláusulas contratuais, quais sejam: a limitação dos descontos ao percentual máximo de 30% (trinta por cento), em relação aos contratos celebrados com o réu. Pede, ainda, a devolução em dobro de todos os valores pagos a maior.
Passo a apreciar pontualmente os questionamentos.
DA LIMITAÇÃO DA LIDE
As partes firmaram os seguintes contratos:
1º Contrato Nº 2006/118225-1, no dia 04.08.2006, no qual ficou acordado o empréstimo da quantia de R$ 23.190,27 (vinte e três mil, cento e noventa reais e vinte e sete centavos), a serem pagos em 48 prestações de R$ 860,85 (oitocentos e sessenta reais e oitenta e cinco centavos) (doc. de fls. 68/69);
2º Contrato Cédula de Crédito Bancário Nº 02166834, no dia 15.03.2007, no qual ficou acordado o empréstimo da quantia de R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais), a serem pagos em 1 prestação no dia 15.06.07 (doc. de fls. 30/33);
3º Contrato Cédula de Crédito Bancário Nº 059.100453-4, no dia 23.02.2007, no qual ficou acordado o empréstimo da quantia de R$ 5.506,32 (cinco mil, quinhentos e seis reais e trinta e dois centavos) (doc. de fls. 77/81);
DA APLICAÇÃO DO C.D.C.
Cumpre-se, inicialmente, destacar que o sistema contratual regido pelo Código Civil é calcado na chamada teoria clássica dos contratos, na qual vigem os princípios da igualdade das partes, da obrigatoriedade e da intangibilidade, sendo diminutas as hipóteses de revisão contratual.
Ocorre que com a massificação dos contratos e com a evolução social houve a necessidade de introdução no ordenamento jurídico de instrumentos que visassem a regulação dos contratos de massa (contratos de adesão), com o objetivo de proteção do hipossuficiente e o reequilíbrio das partes.
Com a introdução do CDC, por meio da Lei nº 8.078/91, passou a ser normatizada as relações jurídicas consumeristas, na qual a visão do contrato é ligeiramente modificada, sendo admissível a interferência do Judiciário na modificação das cláusulas contratuais (mitigação dos princípios da intangibilidade e obrigatoriedade), com o objetivo de promover o reequilíbrio das partes.
Em razão de sua finalidade, o Código de Defesa do Consumidor é chamado de "código dos desiguais", porque constitui um microssistema jurídico regulador de específicas relações caracterizadas pela qualidade das partes envolvidas, quais sejam: o consumidor, aquele que vai ao mercado de consumo para adquirir ou utilizar os bens ofertados como destinatário final destes, reconhecidamente vulnerável, e o fornecedor, aquele que coloca o produto ou serviço no mercado de consumo em razão da atividade mercantil e habitual que exerce, reconhecida sua superioridade econômica.
O Código de Defesa do Consumidor é aplicável à espécie dos autos, pois o autor é consumidor e o réu é fornecedor de bens e serviços, na forma do § 2º do art. 3º, Código de Defesa do Consumidor.
Nesse sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento de que "a jurisprudência da Segunda Seção está consolidada no sentido de incidir nos contratos bancários o Código de Defesa do Consumidor, estando caracterizada uma relaç
ão de consumo entre a instituição financeira e o cliente." (AGRESP 578985 / RS, Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, 3ª Turma, publicada no DJ de DJ DATA:15/03/2004, PG:00273). Ainda a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal na APC 2001.01.1.123792-2, Relator designado Desembargador Hermenegildo Gonçalves, DJ de 13/04/04, p. 28.
DA REVISÃO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS
DA LIMITAÇÃO DO PERCENTUAL DE 30%
O percentual de 30% é extraído do Decreto Federal nº 4.961/2004, vigente à época, que autoriza a disponibilidade de parte da remuneração do servidor para a captação de empréstimos consignados, ou seja, há um reconhecimento de disponibilidade parcial do salário, no qual não incidiria o entendimento de verba alimentar, pois é parte da verba destinada a aquisição de bens de consumo.
De outro lado, é forçoso reconhecer que a regra do artigo 313 do Código Civil é expressa ao dispor que "o credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa."
Ou seja, de uma análise simplista destes dois dispositivos, é forçoso reconhecer que por força de hierarquia normativa a regra legal se sobrepõe à disposição do decreto.
Entretanto, a questão não se restringe a análise sob o enfoque legal, mas há entendimentos de cunho constitucional, pois a verba salarial possui nítido cunho alimentar, a fim de propiciar a própria subsistência. Assim, entende-se que reconhecer a salvaguarda de 70% (setenta por cento) da verba de natureza alimentar, estar-se-á salvaguardando a própria dignidade da pessoa humana que é um dos princípios fundamentais (art. 1º, III da CF/88)
No caso em apreço, esta proteção constitucional encontra-se salvaguardada no ordenamento por meio do C.D.C. que possibilita no caso contrato o reconhecimento da vida como um direito básico do consumidor (art. 6º, I do C.D.C.), assim como possibilita o reconhecimento de obrigações que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade (art. 51, IV do C.D.C.).
Assim, a questão encontra suporte tanto em regra constitucional, quanto em regra infraconstitucional.
Merece destaque a análise da boa-fé frente à relação contratual, porquanto esta não se assenta apenas em uma concepção psicológica, mas se estende ao sentido ético do ato, devendo a conduta dos contratantes sempre se pautar no dever de lealdade e clareza, seja na formação, na concretização e na execução. É certo que a boa-fé veio a ser inserida no Novo Código Civil com o status de regra positivada, mas isto não significa que no Código de 1916 não existisse. Naquele ordenamento era interpretada como um princípio geral do direito contratual.
Com a edição do Novo Código Civil (Lei nº 10.406/02), houve uma sensível alteração no campo do direito contratual, pois foram positivadas as chamadas cláusulas gerais, pois de acordo com a regra do artigo 422 do CC, "os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé" e a "liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato". (art. 421 do CC).
O Professor Luiz Guilherme Loureiro leciona que a função social do contrato deve ser interpretada "como instrumento jurídico destinado a possibilitar e dar segurança à circulação de riqueza, o contrato tem o seu desenvolvimento vinculado ao desenvolvimento econômico da sociedade" (Teoria geral dos novos contratos. Ed;. Método: São Paulo, 2002, pág. 50), ou seja, a função social do contrato é velar pela eqüitativa distribuição de riquezas.
Neste diapasão, assevera que a boa-fé objetiva
depende largamente de uma intuição: os contratantes devem respeitar certas regras morais, que se situam entre dois pólos, de uma parte um aspecto subjetivo, no qual a boa-fé se confunde com a lealdade; e de outra um aspecto objetivo, no qual está a boa-fé aquele que se comporta de forma correta. (idem. págs. 65/66).
Assevera, ainda, que
a boa-fé proíbe que as partes regressem contra os próprios atos, proibição que se explica pelo dever de agir de fora coerente com a sua manifestação de vontade por ocasião da celebração do contrato. Em termos mais simples, não pode a parte prometer uma coisa e fazer outra. (idem, pág. 74)
No caso em apreço, é forçoso o reconhecimento de ausência de lealdade contratual por parte da instituição financeira que procedeu aos empréstimos sem se atentar para a capacidade de pagamento do consumidor, uma vez que resta claro que nos contratos firmados sequer houve a atenção para o valor da remuneração percebida pelo autor.
Para quem não conhece a política interna da empresa fica a impressão de que é mais cômodo facilitar a contratação de novos consumidores e com isto receber uma quantidade grande de clientes que trarão lucro, embora tenha, eventualmente, que suportar o ônus de arcar com a responsabilidade de alguma delas que, em razão de não ter obedecido aos parâmetros da prudência, venha a causar pr
ejuízo a outrem.
Esta situação faz lembrar o conceito de risco-proveito, segundo a qual "responsável é aquele que tira proveito da atividade danosa, com base no princípio de que, onde está o ganho, aí reside o encargo - ubi emolumentum, ibi ônus". (FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo. Editora Malheiros, 2000, pág. 144).
Assim, reconheço que a instituição requerida não agiu com a lealdade necessária no momento da feitura do pacto contratual, o que faz reconhecer a abusividade da relação contratual, em face da quebra da boa-fé.
Neste sentido, trago à colação os presentes arestos:
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. AÇÃO REVISIONAL. EMPRÉSTIMO BANCÁRIO. DESCONTOS EM CORRENTE. PAGAMENTO QUE COMPROMETE A SUBSISTÊNCIA DO DEVEDOR. MODIFICAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. É possível a revisão da cláusula que autoriza o banco a descontar, na conta do devedor, o percentual de 30% de seus salários brutos, quando tal desconto compromete a própria subsistência do devedor assalariado e de sua família. 2. Assim, é de ser acatado o pedido de antecipação de tutela, para determinar que o percentual de desconto de 30% (trinta por cento) incida apenas sobre os vencimentos líquidos do devedor, e não sobre o bruto, até julgamento final da causa. DECISÃO: Recurso conhecido. Deu-se parcial provimento". (20070020104382AGI, Relator JESUÍNO RISSATO, 5ª Turma Cível, julgado em 12/12/2007, DJ 05/03/2008 p. 131)
"3. Assim, haja vista o que dos autos consta, tendo o correntista demonstrado que os valores descontados alcançam grande parcela de sua renda proveniente de salário, comprometendo sua subsistência, de modo que não lhe resta sequer a opção de manter o sustento básico ou proceder à quitação de suas dívidas, considero que a cláusula em questão deve ser limitada, não podendo, os descontos, ultrapassarem a margem de 30% (trinta por cento) da renda do autor a título de salário. 4. In casu, não há que se falar na compensação dos valores eventualmente pagos a maior, em razão da cobrança de comissão de permanência com outros encargos, com os valores a serem apurados no saldo devedor do Autor, haja vista a ausência de provas da ilícita cumulação. 5. Recursos dos Requeridos parcialmente providos. Sentença reformada". (20030110367015APC, Relator FLAVIO ROSTIROLA, 1ª Turma Cível, julgado em 01/08/2007, DJ 28/08/2007 p. 109)
Em conseqüência, é forçoso o acolhimento da pretensão deduzida pelo autor, no sentido de compelir a repactuação das prestações, a fim de limitá-las ao desconto mensal de 30% (trinta por cento).
Frisa-se que a modificação, com a limitação de percentual de descontos, acarretará num alongamento da dívida, sendo lícito à instituição financeira continuar a incidir os encargos de cunho remuneratório do capital empregado, assim como as demais cláusulas contratuais que não foram modificadas.
DA REPETIÇÃO DE INDÉBITO
Ora, se restar demonstrada a cobrança de valor a maior, é forçoso o reconhecimento da possibilidade de restituição da quantia, sob pena de enriquecimento ilícito.
Entretanto, não é aplicável a norma do artigo 42, parágrafo único, do C.D.C. que determina a restituição em dobro, porquanto a cobrança era lastreada em contrato válido e eficaz, o que retira eventual má-fé na cobrança, a fim de ensejar a restituição em dobro.
Em que pesem os argumentos acima, no caso em apreço não restou demonstrada a existência de pagamento a maior, a fim de justificar a incidência da regra de repetição de indébito.
Se não há prova do direito alegado, não há como acolher o pedido formulado.
DO DISPOSITIVO
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE, em parte, o pedido formulado na inicial e CONDENO o requerido a repactuar os valores das prestações dos contratos celebrados entre ele e o autor até a data da propositura da ação (08.04.10), limitando os descontos ao percentual de 30% (trinta por cento) da remuneração bruta percebida pelo autor. Em conseqüência, resolvo o mérito, nos termos do artigo 269, I, do C.P.C.
Em face da sucumbência recíproca cada parte arcará com o pagamento dos honorários advocatícios de seu patrono, nos termos do artigo 21 do C.P.C. Rateiem-se as custas processuais, ficando, todavia, a cobrança suspensa em relação ao autor, porquanto este milita sob o pálio da justiça gratuita.
Após o efetivo cumprimento e o recolhimento das custas, remetam-se os autos ao arquivo.
Publique-se. Registre-se e intime-se.
Brasília - DF, quarta-feira, 20/10/2010 às 18h11.
GIORDANO RESENDE COSTA
Juiz de Direito Substituto

Danielle Cassiano Albo

Advogada

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