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Progressão de regime nos crimes hediondos

 

 

(HC nº 82.959)

Elaborado em 03.2006.

José Eduardo de Lucena Farias

advogado em João Pessoa (PB)

No dia 23 de fevereiro de 2006, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do Habeas Corpus 82959, cujo objeto era o pedido de progressão de regime de condenado por crime hediondo.

O Tribunal, por maioria, deferiu pedido de Habeas Corpus e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, que veda a possibilidade de progressão do regime de cumprimento da pena nos crimes hediondos definidos no art. 1º do mesmo diploma legal.

A decisão é um marco, pois altera o pensamento dominante na corte em outros tempos. A nova composição foi determinante para mudança do entendimento (só no governo do presidente Luis Inácio Lula da Silva foram nomeados 5 novos Ministros)

O dispositivo atacado em sede de Habeas Corpus foi o § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, que dispõe:

Art. 2º, § 1º A pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado.

Para se chegar a declaração de inconstitucionalidade incidenter tantum, o pleno se utilizou de três fundamentos:


a)A vedação de progressão de regime prevista na norma impugnada afronta o direito à individualização da pena

A violação do direito de individualização da pena prevista no art. 5 º, LXVI, da Constituição Federal é um dos pressupostos para se afirmar a inconstitucionalidade do o § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90.

Alberto Silva Franco ensina que "o sistema progressivo de cumprimento da pena privativa de liberdade está também vinculado ao princípio constitucional da individualização da pena. Tal princípio garante, em resumo, a todo cidadão, condenado num processo-crime, uma pena particularizada, pessoal, distinta e, portanto, inextensível a outro cidadão, em situação fática igual ou assemelhada. A questão da individualização da pena tem sido objeto de exame em três níveis: constitucional, legal e judicial. Não há dúvida de que a individualização da pena assumiu, na Constituição Federal, a condição. de direito fundamental do cidadão posicionado frente ao poder repressivo do Estado. Não é possível, em face da ordem constitucional vigente, a cominação legal de pena, exata na sua quantidade, nem a aplicação ou execução de pena, sem intervenção judicial, para efeito de adaptá-la ao fato concreto, ao delinqüente ou às vicissitudes de seu cumprimento. Em nenhuma dessas situações haveria, de fato, um processo individualizador da pena: tudo já estaria predisposto, o que entraria em atrito com o próprio conceito de individualização que quer dizer ´´considerar individualmente´´, ´´um a um, em separado´´, ´´particularizar´´, ´´distinguir´´. Este é o sentido e o objetivo da norma constitucional. [...] Excluir, portanto, o sistema-progressivo, também denominado ´´sistema de individualização científica´´, da fase de execução é impedir que se faça valer, nessa fase, o princípio constitucional da individualização da pena. Lei ordinária que estabeleça regime prisional único, sem possibilidade de nenhuma progressão atenta, portanto, contra tal princípio, de indiscutível embasamento constitucional" [1].

Em outras palavras, ao não admitir a progressão, a lei dos crimes hediondos deixa de considerar todo comportamento do preso no cumprimento de sua sentença, a capacidade de reintegração e a ressocialização, violando o princípio da individualização da pena.


b)Incoerência na Lei 8.072/90

Afirma-se que a lei é incoerente, porque ao passo que desconsidera o principio da individualização da pena no § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 e impõe o regime integralmente fechado, admite no art. 5º o livramento condicional.

Nos termos do artigo 83, V, do Código Penal (alterado pelo art. 5º da Lei 8.072/90) conceder-se-á livramento condicional quando o condenado cumprir mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.

Ora, se não se permite a progressão do regime, devendo permanecer o condenado em regime integralmente fechado, qual a razão de se estabelecer o livramento condicional?

Em ambos, o fundamento é o mesmo, senão a individualização da pena. Ora se um argumento é admitido em um dispositivo da lei, não pode em outro ser rechaçado. O legislador deve criar normas harmônicas, sob pena de não se poder aplicá-las.


c)Derrogação tácita do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 pela Lei 9.455/97

A lei 9.455/97 no seu art. 1º, §7º dispõe:

7º O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado.

O enunciado do §7º, do art. 1º, da Lei 9.455/97 revogou o §1º do art. 2º da Lei 8.072/90. No entanto, a lei só o fez expressamente para o crime de tortura. O regime que era integralmente fechado para espécie, passou a ser inicialmente fechado.

No entanto, a tortura é equiparada ao crime hediondo pela Constituição Federal conforme o art. 5º, XLIII:

A lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;

Sendo assim, a de ser dispensado o mesmo tratamento legislativo. A lei infraconstitucional não pode conceder privilégios a um dos crimes e rigores ao outro.

Pensar que o dispositivo estabelece norma específica, beneficiando apenas aqueles que cometem o crime de tortura e não reconhecendo o mesmo privilégio aos que cometem outros crimes hediondos ou equiparados, é negar o principio da proporcionalidade, presente no diploma constitucional.

"O ordenamento jurídico constitui um sistema racional de normas e, como tal, não suporta contradições internas. Não há razão lógica que justifique a aplicação do regime progressivoaos condenados por tortura e se negue, ao mesmo tempo, igual sistema prisional aos condenados por crimes hediondos, por terrorismo ou por tráfico ilícito de entorpecentes. Nem do ponto de vista do princípio da lesividade, nem sob o ângulo político-criminal, há possibilidade de considerar-se a tortura um fato delituoso menos grave em confronto com os crimes já referidos. Ao contrário, considerado isoladamente, o crime de tortura é o mais grave dos delitos constantes do rol constitucional. [...] A extensão da regra do §7º do art. 1º da Lei nº 9.455/97, para todos os delitos referidos na Lei nº. 8.072/90, iguala hipóteses típicas que estão constitucionalmente equiparadas; restabelece, em sua inteireza, a racionalidade e o caráter sistemático do ordenamento jurídico penal e representa uma tomada de posição do legislador ordinário em fina sintonia com o texto constitucional"[2].


CONCLUSÃO

Durante 16 anos, prevaleceu no Supremo Tribunal Federal a tese de que o §1º do art. 2º da Lei 8.072/90 era constitucional. Em razão dos três argumentos citados, alterou-se esse entendimento [3].

A mudança é incipiente e veio tímida, pois ocorreu apenas de forma incidental, decidida incidenter tantum em Habeas Corpus, só servindo para o caso objeto do julgado.

Desta forma, os condenados que quiserem o mesmo benefício poderão ter dificuldades, pois os juizes não estão obrigados a adotar o entendimento. O julgado não tem efeito vinculante. Possivelmente, muitos dos condenados terão que bater às portas do Supremo Tribunal Federal para ter seu pleito atendido.

Ressalte-se que apesar do julgado ter acontecido em controle difuso de constitucionalidade, havendo novo julgamento em controle concentrado, a tendência é manutenção do novo entendimento.

O quorum da votação foi 6 x 5, sendo vencidos os Ministros Carlos Velloso, Joaquim Barbosa, Ellen Gracie, Celso de Mello e Nelson Jobim. O Ministro Carlos Velloso se aposentou compulsoriamente desfalcando os que adotam a constitucionalidade do §1º do art. 2º da Lei 8.072/90. Mesmo com a chegada de um novo ministro, o quorum tende a se manter.


NOTAS

[1] SILVA FRANCO, Alberto. Crimes Hediondos. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p.163, 165

[2] SILVA FRANCO, Alberto. Crimes Hediondos. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p.183- 184

[3] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Plenário. HC n. 82.959. Relator Ministro Marco Aurélio. Informativo n. 417 (23.02.2006). Disponível em:. Acesso em: 20.03.2006.


REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: Parte Geral: volume 1. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2002

GRECCO, Rogério. Curso de Direito Penal. 5. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2005.

SILVA FRANCO, Alberto. Crimes Hediondos. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Plenário. HC n. 82.959. Relator Ministro Marco Aurélio. Informativo n. 417 (23.02.2006). Disponível em:. Acesso em: 20.03.2006.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Plenário. HC n. 82.959. Relator Ministro Marco Aurélio. Informativo n. 315 (06.08.2003). Disponível em:. Acesso em: 20.03.2006.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Plenário. HC n. 82.959. Relator Ministro Marco Aurélio. Informativo n. 334 (18.12.2003). Disponível em:. Acesso em: 20.03.2006.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Plenário. HC n. 82.959. Relator Ministro Marco Aurélio. Informativo n. 372 (02.12.2004). Disponível em:. Acesso em: 20.03.2006.

FONTE:>http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8160

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